quarta-feira, 4 de maio de 2016

Governo Alckmin 'pedala' e dá calote de R$ 333 milhões no Metrô

A manobra ocorreu desde o início comercial da linha, em 2011

BRASIL CONTRATOS

O governo Geraldo Alckmin (PSDB) usou verba da tarifa do metrô paulista para pagar obrigações contratuais com a operadora privada da linha 4-amarela sem ter reembolsado o caixa do Metrô por isso. 

Essa "pedalada", que ocorreu desde o início comercial da linha, em 2011, gerou um prejuízo de pelo menos R$ 332,7 milhões até 2014.
A dívida, no entanto, só foi reconhecida pela gestão Alckmin em acordo firmado com a empresa pública em outubro do ano passado.
Mas a negociação, no entanto, resultou em perdão da dívida, que teve que ser absorvida pelo Metrô como prejuízo em meio à grave crise financeira enfrentada pela empresa.
No contrato assinado em 2006 entre o governo do Estado e a ViaQuatro, concessionária da linha 4, consta que a empresa terá prioridade no saque dos valores arrecadados com a tarifa do transporte público.
Ficou definido também que a tarifa de remuneração paga concessionária não é o valor da tarifa pública (hoje em R$ 3,80) que as empresas públicas recebem -que incluem políticas de gratuidade e integração.
No relatório de administração do Metrô de 2013 já se reconhecia que essa situação "gera impacto financeiro para as empresas públicas do sistema metroferroviário", mas não havia estimativa de valores.

Naquele ano, por exemplo, enquanto a tarifa cobrada do usuário era de R$ 3, a ViaQuatro recebia do governo R$ 3,13 por passageiro transportado sem baldeação -em caso de transferência, o valor era a metade.
No ano seguinte, o balanço patrimonial do Metrô apresentou, no grupo de contas a receber, um valor de R$ 332,7 milhões devido pelo governo do Estado relativo à diferença entre a remuneração da ViaQuatro e o valor da passagem.
O documento classificou esse crédito como "de liquidação duvidosa", ou seja, difícil de ser recebido. Reconhecia-se ali que esse problema gerava "menor arrecadação tarifária da Companhia do Metrô".
Em outubro de 2015, enfim Estado e Metrô celebraram acordo para resolver a questão. Mas ao invés de receber os R$ 332,7 milhões, o Metrô, controlado pelo governo, teve que lançar o montante como "perda da companhia".
Tecnicamente de economia mista, a companhia na prática é controlada pelo Estado: 96% de seu capital pertence ao governo.
Além desse valor, o relatório do Metrô cita outros R$ 136,6 milhões resultantes da continuidade da "pedalada" em 2015. Nem o acordo nem o governo deixam claro se esse valor será pago e se a manobra continua.
Pelo documento, o governo apenas apenas reconheceu sua responsabilidade na saúde financeira da empresa. Diz que será responsável pelo "equacionamento dos efeitos suportados pelo Metrô, em face da regra de rateio da receita tarifária do sistema metroferroviário, naquilo que afetar a sustentabilidade econômico-financeira da companhia".
Em resposta a questionamentos da reportagem sobre o assunto, a Secretaria de Transportes Metropolitanos nega que o acordo seja desfavorável ao Metrô.A pasta afirma ainda que o acordo "tem características unicamente contábeis e não acarretará em danos ou perdas nos serviços prestados aos usuários ou nos benefícios oferecidos aos empregados do Metrô de São Paulo".
Diz ainda que "governo do Estado de São Paulo e Metrô trabalham juntos para oferecer o melhor serviço e fazer os investimentos necessários para a realização de obras e expansão dos serviços".
CRISE
O rombo no caixa só agrava a situação de crise financeira do Metrô. No ano passado, a gestão Alckmin deu um calote de R$ 66 milhões na empresa em 2015, dinheiro que seria usado para cobrir os custos da política de gratuidades. O menor repasse será mantido neste ano.
Sem receber os recursos devidos pelo Estado, a companhia estatal paulista é forçada a cortar custos de operação e abrir mão de investimentos e de melhorias no serviço que presta aos usuários e no quadro de funcionários.
No mesmo ano que abriu mão de R$ 332,7 milhões, o Metrô investiu R$ 264 milhões em manutenção, o menor montante dos últimos anos e cerca de metade dos R$ 524 milhões investidos em 2014.
Apesar da negativa do governo, as consequências para os usuários são claras.
Conforme a Folha de S.Paulo revelou, a empresa já tem menor número de trens à disposição, maior tempo de espera no horário de pico, e vem sendo obrigada a retirar trens de operação para servir de "estoque" de peças.
OUTRO LADO
A reportagem enviou uma série de questionamentos para a Secretaria dos Transportes Metropolitanos e para o Metrô, mas, em uma semana, eles não foram esclarecidos pelos órgãos.
Não foi esclarecido se a manobra usando a verba da tarifa para pagar as obrigações contratuais com a ViaQuatro foram mantidas depois do acordo. Tampouco se o Metrô será reembolsado pelos R$ 136,6 milhões perdidos em 2015 em razão da prioridade no saque da concessionária da linha 4.
A secretaria também não respondeu qual foi o valor das tarifas de remuneração da ViaQuatro nos últimos três anos, nem qual o montante de repasses à empresa.
O contrato da linha 4 prevê reajustes anuais para a concessionária, independentemente da variação no preço da passagem -definida por conveniência política.Os órgãos afirmaram apenas que "não há prejuízo ao usuário do Metrô tampouco na qualidade dos serviços oferecidos" e que "o governo tem todo o interesse de que o Metrô prossiga obtendo resultados positivos em sua operação".
O Metrô disse apenas que o "Estado poderá repassar, a seu critério, as diferenças da arrecadação tarifária. O procedimento poderá ser adotado em caso de problemas na sustentabilidade econômico-financeira da companhia, com possibilidade de mantê-lo até o final da concessão da linha 4, previsto em acordo entre as partes".
Por fim, a gestão Alckmin afirma que investe no transporte. "Somando-se apenas os investimentos de 2016, o governo irá repassar mais de R$ 3 bilhões à empresa para dar continuidade às obras de expansão de suas linhas".
"Sem os aportes financeiros efetuados pelo Estado, o Metrô não teria condições de investir em sua malha, apesar da eficiência de seus sistemas." Com informações da Folhapress.

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